terça-feira, 13 de abril de 2010

Solano Trindade o poeta do povo

Solano Trindade nasceu em Recife a 24 de julho de 1908. Segundo Carlos Drumond de Andrade foi o maior poeta negro que o Brasil já conheceu; o criador da poesia "assumidamente negra". Além disso foi ator, pintor, cineasta e um dos criadores do Teatro Experimental do Negro.

Premiado no exterior, elogiado por celebridades como Darcy Ribeiro, Sérgio Milliet e outros o poeta recifense é muito pouco conhecido pelas novas gerações brasileiras embora tenha contribuído de forma significativa para a cultura e na arte brasileira.

Filho de um humilde sapateiro do bairro de São José, Solano Trindade criou em 1932 no Recife a Frente Negra Pernabucana porém o movimento não vingou. Depois que deixou Recife e fixou residência no Rio de Janeiro e em São Paulo sua obra ganho fama entre a crítica nacional e repercutiu no cenário internacional (essa situação nunca o impossibilitou de realizar oficinas com operários, estudantes e desempregados). Durante esse período idealizou o 1° Congresso Afro-brasileiro e criou em 1945, com Abdias do Nascimento, o Teatro Experimental do Negro.

Em 1944, durante a ditadura do Estado Novo, por conta do poema "Tem gente com fome" foi preso e teve o livro "Poemas de uma vida simples" apreendido.

A partir de 1950, concretizou um dos seus grandes sonhos, fundando com o apoio do sociólogo Edison Carneiro o Teatro Popular Brasileiro (TPB).

Em 1955, criou o Brasiliana, grupo de dança brasileira que bateu o recorde de apresentações no exterior.

No teatro foi Solano Trindade quem primeiro encenou (1956) a peça Orfeu, de Vinicius de Moraes, depois transformada em file pelo francês Marcel Cammus.

Em 1964, um dos seus quatro filhos, Francisco morreu assassiando num presídio carioca durante a ditadura militar.

Em 20 de fevereiro de 1974, Solano Trindade morreu como indigente, numa clínica em Santa Teresa, no Rio de Janeiro.

Todo trabalho de Solano Trindade, quer no teatro, dança, cinema ou literatura, tinha como características marcantes o resgate da arte popular e, sobretudo, a luta em prol da independência cultural do negro no Brasil

Uma das poucas tentativas de trazer de volta o nome de Solano Trindade para o grande público ocorreu em 1975, quando o poema "Tem gente com fome" iria integrar o disco do extinto conjuto Secos e Molhados. Mas como explicou João Ricardo que musicou o poema, problemas com a censura impediram a gravação (a canção só foi gravada na década de 80 por Ney Matogrosso). Em 1976, a escola-de-samba Vai-Vai de São Paulo desfilou com um samba-enredo em sua homenagem. Alé disso uma pequena editora, a Canta e Prantos, reuniu e publicou a obra do poeta no volume: "Solano Trindade - o poeta do povo".



Referência bibliográfica:

MUNANGA, Kabengele; GOMES, Nilma Lino. Para entender o negro no Brasil de hoje: História, realidades, problemas e caminhos. São Paulo: Global; Ação Educativa, 2006.

Irmandades Negras - religiosidade afro-descendente

As irmandades criadas em várias partes do Brasil, sobretudo a partir do século XVII, têm origem na Europa Medieval e tinham como objetivos principais a devoção católica e a caridade, fornecendo assistência técnica aos associados. Para fazer parte dessas associações, era preciso pagar um valor de entrada e as esmolas anuais, destinadas aos gastos com as festas, missas, sepulturas e cortejos fúnebres.

As irmandades eram divididas de acordo com a cor da pele e a condição social, existindo aquelas para brancos e, dentre estas, para os da elite. As associações mais ricas eram as do Santíssimo Sacramento e as das ordens terceiras do Carmo e de São Francisco. Como negros e pardos eram proibidos de participar das irmandades de brancos, criaram-se, então, associações específicas para esses grupos sociais. Dessa maneira, era-lhes incentivada a integração à doutrina católica, mas sem a ocupação do mesmo espaço físico dos brancos.

Em geral, as irmandades de negros tinham devoção por santos negros como Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos, Santo Elesbão, Santa Efigênia e São Benedito. Essas associações, compostas por negros, escravos e libertos, eram importantes para amenizar as agruras da escravidão e promover relações de solidariedade. Elas ofereciam assistência em casos de doença ou de dificuldades financeiras, conseguiam sepulturas, realizavam enterros dignos e ainda podiam ajudar na compra de alforria.

As irmandades dos homens de cor, como eram conhecidas as destinadas aos negros, ainda organizavam-se com base na origem, dividindo -se entre as dos crioulos e as dos africanos. Já entre os africanos, existiam as separações por "nações" ou as que reservavam os cargos mais importantes as "nações" específicas. É o caso das irmandades de Nossa Senhora do Rosário que, em geral, escolhiam para os cargos de direção os africanos de "nação" angola.

Na cidade de São Paulo, existiam três irmandades dos homens de cor: a de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos, a de Santo Elesbão e Santa Efigênia, e a de São Benedito. Uma vez por ano as irmandades realizavam uma festa em homenagem ao seu santo de devoção, compreendendo missas, sermões e procissões. Mas a festa não acabava na igreja, continuando pelas ruas da cidade com desfiles de reis e rainhas ao som de batuques.
O memorialista Antonio Egídio Martins deixou esta descrição da celebração na cidade de São Paulo, no século XIX:

"Por ocasião das solenidades que, antigamente, se efetuavam na igreja de Nossa Senhora do Rosário, em honra desta Santa, se realizavam também, em frente à mesma igreja, festejos populares, postando-se aí um numeroso bando de pretos africanos, que executavam, com capricho, a célebre música denominada Tambaque (espécie de Zé Pereira), cantando e dançando com as suas parceiras, que adornadas de rodilha de pano branco na cabeça, pulseira de prata, e de rosário de contas vermelhas e de ouro no pescoço, pegavam no vestido e faziam requebrados, sendo por isso vitoriados com uma salva de palmas pela numerosa assistência (...)".

Igreja e Irmandade de Santo Elesbão e Santa Efigênia

Em 14 de novembro de 1758, foi provisionada pelo bispo D. Frei Antônio de Madre de Deus Galrão a Irmandade de Santo Elesbão e Santa Efigênia, com sede na Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos, na cidade de São Paulo. Somente em 1794 as imagens dos santos e a Irmandade foram transferidas para uma capela e, no início do ano seguinte, rezada a primeira missa. Mas o príncipe regente só autorizou a transferência da Irmandade em 1801, em provisão datada de 13 de fevereiro.

No início do século XIX, a região que abrangia a capela se desenvolveu e mais residências foram edificadas, compondo o que seria em 1809 a freguesia de Santa Efigênia. Em 1817, uma nova igreja, maior, começou a ser construída, obras promovidas pelo vigário colado Antonio Joaquim da Silva. Esta igreja, com estilo colonial, foi demolida em 1905 e reerguida, em estilo gótico, em 1912, em frente à ladeira do Seminário e ao Viaduto Santa Ifigênia.



Localização: Rua Santa Ifigênia, 30 - Santa Ifigênia, Centro SP


Igreja Nossa Senhora do Rosário da Penha de França


A igreja Nossa Senhora do Rosário da Penha de França foi erguida em 16 de junho de 1802 com o intuito de reunir africanos e seus descendentes em torno da fé católica. Esta irmandade apoiava aqueles que não possuíam recursos financeiros, conseguindo um local digno para serem enterrados,num cemitério próximo a Igreja. Também realizava festa da cultura afro-brasileira, como a congada e o maracatu.


Em 1934, a Igreja de Nossa Senhora do Rosário da Penha de França passou a abrigar a Associação de São Benedito, que igualmente auxiliava nos trabalhos de apoio à população carente. Por volta da década de 1970, as festividades da Igreja e São Benedito foram interrompidas, sendo retomadas apenas em 2002 para a comemoração dos 200 anos da Igreja. Essas festas, com músicas, grupos de congada, moçambique e maracatu e missas-afro, acontecem sempre no mês de junho, em homenagem ao aniversário da Igreja.




Localização: Largo do Rosário, s/n, Penha, região leste SP.


Referência bibliográfica:

MATTOS, Regiane Augusto, etal. Paulicéia afro: lugares,histórias e pessoas. São Paulo: Editora Parma, 2008.

quarta-feira, 31 de março de 2010

LEI No 10.639, DE 9 DE JANEIRO DE 2003.

As ações afirmativas constituem-se em políticas que visam a promoção ativa da igualdade de oportunidades para todos, criando meios para que as pessoas pertencentes a grupos socialmente discriminados possam competir em mesmas condições na sociedade.
Elas podem ser entendidas como um conjunto de políticas,ações e orientações públicas ou privadas, de caráter compulsório, facultativo ou voluntário que têmcomo objetivo corrigir as desigualdades historicamente impostas a determinados grupos sociais e/ou etnico-raciais com um histórico comprovado de discriminação e exclusão. Elas possuem um caráter emergencial e transitório. Sua continuidade dependerá sempre de avaliação constante e da comprovada mudança do quadro de discriminação que as originou.
Essas açoes ações podem ser estabelecidas na Educação,na saúde, no mercado de trabalho, nos cargos políticos, entre outros, enfim, nos setores onde a discriminação a ser superada se faz mais evidente e onde é constatado um quadro de desigualdade e de exclusão. A sua implementação carrega uma intenção explícita de mudança nas relações sociais, nos lugares ocupados pelos sujeitos que vivem processos de discriminação no interior da sociedade, na educação e na formação de quadros intelectuais e políticos. As ações afirmativas implicam, também, uma mudança de postura, de concepção e de estratégia.
A lei n° 10.639 é um exemplo de açao afirmativa.

LEI No 10.639, DE 9 DE JANEIRO DE 2003.

Altera a Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade da temática "História e Cultura Afro-Brasileira", e dá outras providências.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1o A Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, passa a vigorar acrescida dos seguintes arts. 26-A, 79-A e 79-B:
"Art. 26-A. Nos estabelecimentos de ensino fundamental e médio, oficiais e particulares, torna-se obrigatório o ensino sobre História e Cultura Afro-Brasileira.
§ 1o O conteúdo programático a que se refere o caput deste artigo incluirá o estudo da História da África e dos Africanos, a luta dos negros no Brasil, a cultura negra brasileira e o negro na formação da sociedade nacional, resgatando a contribuição do povo negro nas áreas social, econômica e política pertinentes à História do Brasil.
§ 2o Os conteúdos referentes à História e Cultura Afro-Brasileira serão ministrados no âmbito de todo o currículo escolar, em especial nas áreas de Educação Artística e de Literatura e História Brasileiras.
§ 3o (VETADO)"
"Art. 79-A. (VETADO)"
"Art. 79-B. O calendário escolar incluirá o dia 20 de novembro como ‘Dia Nacional da Consciência Negra’."
Art. 2o Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 9 de janeiro de 2003; 182o da Independência e 115o da República.
LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque

Curta: O Xadrez das Cores

Olá queridos seguidores, indicamos para vocês este curta que, certamente, irá lhes proporcionar uma reflexão profundo a respeito dos valores sociais, morais e étnicos-raciais que fazem parte da nossa cultura, mas que não definem aonde chegaremos, se nos for dada a oportunidade devida, independente da nossa "cor".

São 22 minutos de duração, mas que vale cada segundo. Nossa sugestão é que vocês assistam até o final e postem as suas opiniões. Bom divertimento!!!



O Xadrez das Cores


Cida, uma mulher negra de quarenta anos, vai trabalhar para Maria, uma velha de oitenta anos, viúva e sem filhos, que é extremamente racista. A relação entre as duas mulheres começa tumultuada, com Maria tripudiando em cima de Cida por ela ser negra. Cida atura a tudo em silêncio, por precisar do dinheiro, até que decide se vingar através de um jogo de xadrez.








Gênero Ficção

Diretor Marco Schiavon

Elenco Anselmo Vasconcellos, Mirian Pyres, Zezeh Barbosa

Ano 2004

Duração 22 min

Cor Colorido

Bitola 35mm

País Brasil

terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

Vozes - Mulheres (Conceição Evaristo)

A voz de minha bisavó ecoou
criança
nos porões do navio.
Ecoou lamentos
De uma infância perdida.

A voz de minha avó
ecoou obediência
aos brancos-donos de tudo.

A voz de minha mãe
ecoou baixinho revolta
No fundo das cozinhas alheias
debaixo das trouxas
roupagens sujas dos brancos
pelo caminho empoeirado
rumo à favela.

A minha voz ainda
ecoa versos perplexos
com rimas de sangue e fome.

A voz de minha filha
recorre todas as nossas vozes
recolhe em si
as vozes mudas caladas
engasgadas nas gargantas.

A voz de minha filha
recolhe em si
a fala e o ato.
O ontem - o hoje - o agora.
Na voz de minha filha
se fará ouvir a ressonância
o eco da vida-liberdade.

In: Cadernos Negros, vol. 13, São Paulo, 1990.

sábado, 6 de fevereiro de 2010

Criação do blog

O que o Atlântico uniu, ninguém irá separar
Esse blog foi criado em 6 de fevereiro de 2010 e tem como objetivo promover a reflexão a cerca das relações etnico-raciais a fim de superar visões pautadas no senso comum construidas historicamente.

As palavras de Costa e Silva (1994) reafirmam nosso posicionamento com relação a importância da África e dos africanos para a constituição de uma identidade nacional, quando diz que: "O Brasil é um país extremamente africanizado. E só quem não conhece a África pode escapar quanto há de africano nos gestos, nas maneiras de ser e de viver e no sentimento estético do brasileiro. Por sua vez, em toda a outra costa atlântica podem-se facilmente reconhecer os brasileirismos. Há comidas brasileiras na África, como há comidas africanas no Brasil. Danças, tradições, técnicas de trabalho, instrumentos de música, palavras e comportamentos sociais brasileiros insinuaram-se no dia-a-dia africano. É comum que lá se ignore que certo prato ou determinado costume veio do Brasil. Como entre nós, esquecemos o quanto nossa vida esta impregnada de África. Na rua. Na praça. Na casa. Na cidade. No campo. O escravo ficou dentro de todos nós, qualquer que seja a nossa origem. Afinal, sem a escravidão o Brasil não existiria como hoje é, não teria sequer ocupados os imensos espaços que os portugueses lhe desenharam. Com ou sem remorsos, a escravidão é o processo mais longo e mais importante de nossa história."

Referência bibliográfica:
SERRANO, Carlos, Waldman, Mauricio. Memória d'África: a temática africana em sala de aula. São Paulo: Cortez, 2007.